segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

A queda da criança

"Ela se atirou tão loucamente pelas nuvens que a faziam fria, porém estranhamente desperta de todo o mau que ousava nascer de dentro de seu cântico inocente, que nem por um momento pensou no fato de que não sabia voar.
Mas ela não caia sozinha, a seu lado todos a quem ela ajudou a mutilar os sentidos caíam com ela e por ela, dezenas e centenas de vezes mais rápidos, unicamente porque nasceram afim de representá-la na imensidão vazia de uma última queda.
Ela soube enlouquecer a todos com sua voz rouca e seu olhar cristalino, soube cantar a desgraça de cada um dos presentes no teatro mágico, os quais não esperaram pelo fim de suas vidas e quiseram antecipar a viagem final.
A queda parecia ser a liberdade em sua forma mais plena e isso a anestesiou do desespero do porvir.
Enquanto se esquecia de sua frágil vida, imaginou por instantes como seria seu fim ideal; se se apagaria no instante do impacto profundo de seu corpo contra o solo, ou se cairia para sempre, uma queda pela outra, um infinito de gravidade para nada.
Pelo que se soube, todos a quem ela enlouqueceu foram eficientes em caírem primeiro, se chocando rápidos e seguros, compondo arte em se desfazerem como energias puras que eram.
Foram tantos suicídios plenos, tantos encontros de matérias, que o solo logo se encheu de mortos, e uma cama de paz e serenidade banhada em sangue se fez lírica e plena esperando o pouso forçado da criança que não conseguia morrer.
Ao emergir da cama de maldição, loucura e sobretudo odor pútrido, ela sorriu vermelha, e não teve uma criatura da noite que não comemorou a alegria de salvar-lhe a vida... de morrer por ela uma vez mais."

(Trecho de "Por Toda a Eternidade")

ouvindo: Ludovico Einaudi - Nuvole Bianche

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