segunda-feira, 11 de junho de 2012

Fantasma particular

Pensando bem, o que fez com que me apaixonasse foi a música.
The National sempre faz isso comigo, e não seria a primeira vez que os caras traduziriam meus sentimentos tortos em acordes melancólicos.
O ônibus lotado, um lugar vago na poltrona estrategicamente posicionada, a chuva fina cobrindo tudo como uma neblina, o banho traduzindo em cores o cheiro de roupa limpa e eu me perdendo nas paisagens bucólicas dos dias que não querem acontecer, era o vislumbre mais que necessário do porvir.
Não foi para me tornar o fantasma de ninguém que eu cheguei até onde cheguei, muito menos de uma estranha no ônibus indo para o trabalho; mas isso foi o mais perto que consegui chegar de ficar longe de mim, e por uma semana, fiquei bobo de amor...
Quando me encostei para sentir o piano solar, esqueci minha vista na janela e foquei-a triste, ouvindo qualquer coisa com o coração, cantarolando com os dedos e unhas roídas uma canção de ninguém.
Tão jovem, tão pura...
Sou daqueles que nunca dizem nada, estudam calados os amores, articulam reviravoltas sutis e trocam suas liberdades e desejos do coração, pelos olhares tortos e passageiros dos passageiros, numa esperança cega e inocente, de se cativar pelo abismo.
Mas não foi o caso da garota em questão, a quem decidi tornar o real concreto, e buscar em "ois" singelos, o cale-se doloroso para um coração que anda se cansando de esperar.
É a solidão pregando peças...
Mas o que vi no reflexo do vidro, não foi apenas um reflexo no vidro: foi reflexo da solidão de alma, da busca desesperada por auto-aceitação, o encontro maravilhoso com meu anjo do passado.
Eu vi a pequena de sempre, a mesma que eu achava que havia perdido assombrada pelo sonho americano, a única que, bela e singular,  me acompanhou por incontáveis aventuras madrugadas adentro, ouvindo, sem nunca me julgar por isso, o grito ensurdecedor do meu silêncio.
Ela, e somente ela, eu devo encontrar toda manhã, quando evito o ônibus das 7:54, e troco a realidade sem graça de uma anônima poetiza de imagens refletidas, pelos acordes suaves, de meu fantasma particular.

Ouvindo: The National - "Lucky You"